O duplamente santista, José Roberto Torero, é escritor, jornalista, cineasta e roteirista de filmes e séries para o cinema e a televisão. Ganhador do Prêmio Jabuti de Literatura em 1995 com o livro “O Chalaça”, é autor de dezenas de livros plenos de humor, história e estórias para todas as idades, entre eles: “Terra Papagalli”, “Os 33 porquinhos”, “Santos, um time dos céus”, “Papis et Circenses”. “As Belas Adormecidas (e algumas acordadas). Roteirista da série “Retrato Falado”, protagonizada por Denise Fraga, no “Fantástico”. No cinema, dirigiu curtas e longas metragens, mas destacou-se como um de nossos melhores roteiristas em “Pequeno Dicionário Amoroso”, “Memórias Póstumas”, ”Como fazer um filme de amor” e “Uma história de futebol”, este último indicado, em 2001, ao Oscar de Melhor Curta Metragem, categoria live action (filme com atores).. Atualmente escreve o “Diário de Bolso”, uma deliciosa sátira da rotina e das ideias do Presidente Jair Bolsonaro, publicado em suas páginas no Facebook e no Instagram:  @jrtorero.


P – Você costuma ser um entrevistador inusitado, tendo já entrevistado vários objetos. Para encontrar os diferentes finais para a sua Bela Adormecida você pediu sugestões a ela? E, entre os finais apresentados, qual é o preferido dela? E o seu?

R – Não entrevistei a Bela. Só a bruxa. Quantos aos finais, gosto daqueles em que a princesa sofre com problemas adolescentes, como crescer muito ou ter pelos demais: Mas também gosto do príncipe alienígena e do final em que o leitor é quem acorda a Bela. 

P – No mundo do futebol, ainda essencialmente masculino e machista, há espaço para o futebol feminino ser visto com outros olhares?

R – Acho que sim. Mas o avanço é lento e com passos para trás de vez em quando (como tudo no Brasil). Mas, pensando num prazo mais longo, estamos muito melhores do que há vinte anos. E há quarenta nem falaríamos sobre este assunto. 

P- Como foi o episódio da censura do Facebook? Como você vê, de forma geral,  esse poder de censura das bigtechs? 

R – A censura do Face foi logo no começo do Diário do Bolso, uma página onde escrevo como se fosse Bolsonaro. Imagino que alguns bolsominions tenham reclamado e o Face suspendeu um texto. Depois outro e mais outro. Sempre tentei argumentar com eles e perguntei o motivo das suspensões, mas nunca me responderam. Porém, acabou sendo uma sorte. Os leitores passaram a espalhar os textos por Whatsapp e vários sites grandes, como Jornalistas Livres, Rede Brasil Atual e Carta Maior, se dispuseram a publicar os textos censurados. E, depois, todos os outros, com o que o Diário do Bolso acabou tendo um número de leitores impensável. Quanto ao poder das bigtechs, como diria Vicente Matheus: “é uma faca de dois legumes”. É preciso algum freio, senão a agressividade pode transbordar. Por outro lado, o freio pode ser ridículo, parcial e burro.

P –  Diferentemente de roteiros para cinema e televisão, não  é  comum encontrarmos livros de ficção escrito por uma dupla de autores. No entanto, sua parceria com Marcus Aurelius Pimenta  rendeu excelentes livros, sucessos de crítica e público. Como funciona a parceria na produção (no sentido amplo) do livro?

R – É mesmo algo muito raro em literatura. Ainda mais com regularidade. Para nós funciona muito bem. Claro que é chato dividir os lucros. Mas, como são pequenos, não dói tanto. E eu não teria feito nem metade dos livros sozinho. Nosso modo de trabalho é o seguinte: 1-) Planejamos o livro juntos; 2-) Um escreve a primeira versão inteira; 3-) O outro reescreve tudo; 4-) O primeiro rerreescreve;  5-) O segundo rerrerrescreve; 6-) Ficamos nesse vai e vem até acharmos que o livro está decente. 7-) Então fazemos as últimas versões cara a cara, lendo o livro em voz alta e discutindo cada mudança de vírgula. Não é algo muito rápido. Mas, em compensação, temos dois achando defeitos e procurando soluções. 

P – Como você vê o atual momento, no qual a imprensa sofre constantes ataques de políticos e seus seguidores? A imprensa tem dado motivos para essa perseguição?    

R – Acho que a grande imprensa está se saindo bem. Tirando, é claro, as assessorias de imprensa, como Record, SBT e Jovem Pan. E realmente a grande imprensa tem dado motivos à perseguição que sofre. Afinal, onde já se viu ficar falando dos erros do governo?!

P – Como santista apaixonado, que é diferente de fanático, não poderia deixar de perguntar: Quando nasceu a paixão pelo Peixe?  Ainda vai à Vila Belmiro?

R – Eu nasci em Santos, no ano em que o time foi bicampeão mundial. Além disso, meu pai era muito santista. Não tive escapatória. Quando a pandemia passar, certamente voltarei à Vila e ao Pacaembu, porque uma das melhores coisas da vida é ver uma vitória do Santos e comer um sanduíche de pernil para comemorar.

P – O Lelê existe? Ele vai crescer um dia e parar de fazer perguntas para tornar-se um adolescente chato?

R – O Lelê é o que eu lembro de mim quando criança. Acho que ele não vai crescer. Eu era um adolescente muito sem graça.

P – Você foi a Los Angeles em 2001 ou ficou assistindo o Oscar pela TV numa padoca em Santos? Tapete vermelho ou toalha xadrez e média com pão e manteiga?   

R – Eu fui na cerimônia do Oscar quando “Uma história de futebol”, do qual sou um dos roteiristas, concorreu na categoria de curta-metragem estrangeiro. Foi uma experiência engraçada e triste. E não gosto de ver jogo de futebol em padarias. Dá muito mais nervoso do que ver o vivo, no estádio. Aliás, assistir a um jogo no campo é insuperável. Ainda mais se houver um sanduíche de pernil depois. Ops, acho que já falei isso, não? É que está na hora da janta. Aceitam um sanduichinho de pernil?

P – Aceitamos, contanto que você nos dê mais uma resposta. Por que a experiência em LA foi engraçada e triste?

Fui à festa do Oscar há exatos 20 anos. Na chegada havia um congestionamento de limusines. E as calçadas estavam cheias de fãs malucos. Lembro que havia uma Marilyn, um Super-Homem e um Jesus Cristo que benzia todos os carros. Entrei no tapete vermelho logo atrás de Julie Andrews. Quase pedi um autógrafo na minha gravata borboleta. Mas ela era alugada e eu não podia perder o depósito. Depois fui sentar no meu lugar, que era muito longe do palco. Provavelmente um espaço reservado para concunhados dos genros das sogras da tia-avó dos assistentes de produção. Fiquei no terceiro e último andar, de modo que, para ver o apresentador Steve Martin, eu tinha de apertar bem os olhos e ter um pouco de imaginação. Mas o chato mesmo é que nosso curta perdeu. Poderia ter sido o primeiro filme brasileiro a ganhar o Oscar. Porém, ficaremos para sempre no limbo do quase. Nestes momentos há que ser maduro e adulto. Por isso, no dia seguinte, fui me consolar na Disneylândia. 

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