Todo mundo tem aquele tio que sempre quer ser o mais legal, que gosta de quebrar regras, que na verdade, se aproxima mais da gente e, às vezes, até deseduca.

Quero falar do meu Tio Augusto, um dos irmãos da minha mãe. Era uma figura, um homem inteligente, engraçado, que gostava de ler, mas que tinha suas esquisitices. Seu apelido Lula Marcha Lenta (nada a ver com o ex-presidente).

Era a década de 60, eu tinha 14 anos e uma vez ele cismou de me levar para a praia, mais especificamente, para Itanhaém, mas tinha que ser de trem, aquele da antiga Estrada de Ferro Sorocabana. 

E lá fomos nós: eu, meu tio Augusto e meu primo Eder, que tinha apenas 7 anos de idade. Saímos de São Caetano do Sul, onde ele morava, às 4h30 da manhã, fomos até a Estação da Luz e depois até a Estação Júlio Prestes, de onde saía o famoso trem. 

E meu tio já foi avisando que a viagem era longa, que o trem iria a apenas 5km por hora, que atravessaríamos 27 túneis e que deveríamos nos sentar no chão, ou melhor, na porta, e que era para fazer bagunça e barulho nos túneis, lembrando que, naquele tempo, os trens seguiam viagem de portas abertas. 

Ele planejava uma aventura com os sobrinhos e até que conseguiu. O trem levou quase 7 horas para chegar em Pedro Taques e, já na baixada, parava a cada quilômetro, até mesmo fora das estações. Como não tinha banheiro, nessas paradas as pessoas desciam para urinar nos trilhos mesmo.

Eu, adolescente, tímido e envergonhado, me segurei, mas o meu primo, criança ainda, quis descer. Fiquei sozinho no vagão tomando conta da bagagem, até hoje não sei por que levávamos tanta tranqueira. Até que o trem deu sinal de partida, me apavorei e gritei para o tio “Sobe que o trem está partindo”.  E ele na sua calma habitual respondeu “Calma fio, o trem vai parar ali na frente, a 200 metros e eu alcanço”. 

O trem partiu, e passaram 200m, 500m, um quilômetro e o trem foi embora. Eu, apavorado, com aquele monte de tranqueiras, sem nem saber direito onde estava. O povo doido do trem, aliás nunca vi tanta gente doida e esquisita, me acalmou e alguém me explicou onde eu deveria descer.

Seguimos e quando eu já estava tranquilo, chegando ao meu destino, do nada aparecem na minha frente, meu tio e meu primo, dando muitas risadas.

Eles conseguiram uma carona na estrada e chegaram antes do trem. E foi muita sorte até porque, nem dinheiro tinham, tudo estava comigo. 

Final da história: 10 horas de viagem, um sufoco e encontramos minha tia que já nos esperava. Agora perguntem se eu voltei a me aventurar com o Tio Augusto…nunca mais!

Por Paulo Sérgio

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Cristina Bonafé
Cristina Bonafé
2 anos atrás

Excelente história, com narrativa bem agradável.
Nem precisava fazer outro passeio com o tio. Um passeio já vale por todos!!
E este “tio bem maluquinho”… Poderia ser personagem do Ziraldo, mas é de Paulo Sérgio.
Este tio maluquinho foi bem didático, inclusive com aula prática. Logo cedo, o sobrinho já viu o que é a vida: uma aventura vibrante e desafiadora, que não se sabe no que vai dar.

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