A queda do Muro

Entre 1989 e 1991, o processo iniciado pela queda do Muro de Berlin, seguido da implosão das ditaduras satélites e, por fim, a dissolução da própria União Soviética, levou muitos filósofos e historiadores a decretarem a vitória definitiva do Capitalismo e da democracia liberal. Chegou-se a falar em “Fim da História” (Francis Fukuyama). Antevia-se uma era de paz e prosperidade, dessa vez global, uma vez que teriam sido superadas as seculares discussões e divisões entre a direita e a esquerda, que vinham desde os tempos da Revolução Francesa, exatos duzentos anos antes da queda do Muro.

Não é preciso sequer abrir a janela de nosso quarto para constatar o grande equívoco dos bem intencionados, mas ingênuos, profetas da paz e prosperidade global. Não há nada mais distante do Paraíso Capitalista do que o quadro atual. Permanecem, impávidas e intocáveis, as guerras, a miséria, a fome, as ditaduras, a xenofobia e a desigualdade. Todas elas gerando uma legião de miseráveis vagando pelo mundo ─ os refugiados ─ e de cidadãos e cidadãs invisíveis, descartáveis, deserdados e desalentados em seus próprios países. 

Mesmo se considerarmos o extraordinário desenvolvimento tecnológico e a consequente e espantosa criação de riquezas desse período, é possível, também, afirmar que não há outro período da História em que os fatores negativos aqui apontados tenham ocorrido em tamanha magnitude do que nos últimos trinta anos. As causas desse fenômeno são tão múltiplas e variadas que nem mesmo centenas de livros conseguem explicar, que dirá esse despretensioso blog. O fato é que esquerda e direita, como conceitos, estilos de vida e identificação político-social, sobreviveram e estão mais vivos do que nunca, para o bem e para o mal.

Vejamos as redes sociais ─ sempre elas ─, nas quais bilhões de pessoas, diariamente, discutem e agridem-se em nome de sua ideologia, ou melhor, do que eles julgam ser a sua ideologia. De um lado, espumam os fascistas, do outro, berram os esquerdopatas. Esses termos são apenas exemplos grosseiros e, geralmente, mal utilizados. Tentem, por exemplo, definir se a China é de direita ou esquerda, já que é uma ditadura capitalista de partido único (e comunista). Difícil, né.

Certamente, mais de uma vez, já lhe perguntaram: você é de esquerda ou de direita? Duvido que você tenha respondido de imediato. Ainda que você seja um fã de carteirinha e admirador incondicional de Pinochet ou morra de amores pelo regime cubano e tenha o pôster de Chê na parede do seu quarto, você pensará duas vezes. Por vezes, para não magoar o seu interlocutor e, na maioria das vezes, porque você é uma pessoa inteligente e recusa rótulos, porque estes não definem ninguém.

Pinochet
Chê

Isso não impede nenhum de nós de termos convicções ideológicas. Mas, em geral, somos de esquerda em alguns temas e de direita em outros. É normal e não desmerece ninguém. São tão diversos os temas em que nos vemos obrigados ─ até sem querer─ a tomar posição, que não é sensato que fiquemos amarrados a dogmas, que não criamos e pelos quais não somos responsáveis. Os romanos tinham razão: “Virtus in medium est”, o que significa que o radicalismo, quase sempre, é a pior das opções. Radicais de direita e de esquerda são avessos a discussões civilizadas e totalmente refratários ao império da Razão. Guiam-se por paixões. Só se sentem bem entre os seus. Têm inimigos e não adversários.

Que tal nos desfazermos desses e de outros rótulos e trabalharmos juntos? O mineiro de Montes Claros, Beto Guedes,  resumiu tudo isso numa linda canção.  Ouçamos: 

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