ERA O ANO DE 1929, quando minha mãe Maria nasceu. Meus avós moravam no interior do Estado, mais precisamente na cidade de Faxina, que hoje se chama Itapeva, próxima das cidades de Itaberá e Itapetininga, quase divisa com o Paraná.

Com seus pais e irmãos, minha mãe morava em uma daquelas casas de madeira, com varanda grande, que hoje vemos apenas nas fotos antigas e talvez em algumas cidades do sul. Enquanto isso, seus avós moravam em uma fazenda, de nome Pouso Alto, onde seu avô José Pires era o administrador.

Hoje, mesmo com sua idade avançada, minha mãe ainda tem muitas lembranças e acumula muitas saudades do que viveu ali, ela passa as tardes contando e recontando seus “causos”, para os filhos, para os netos, para quem quiser ouvir. 

 

Minha mãe era a terceira, entre os onze irmãos, filhos da Dona Adelina e do Sr. Enoch, e tem uma memória privilegiada, sendo capaz de relatar, nos mínimos detalhes, inúmeras situações que viveu durante sua infância e adolescência.

Ela se lembra do nascimento dos irmãos e da morte de alguns outros, ainda bebês. Se lembra do desespero da minha avó, diante das tragédias da família e da difícil situação financeira que enfrentavam. Mas se lembra muito bem também, com muito carinho, da paciência, da fé e equilíbrio do seu pai, aliás qualidades que ela herdou.

Pois bem, entre suas folclóricas lembranças, ela fala muito de um episódio que aconteceu com sua família em 1932, durante a Revolução Constitucionalista, quando ela tinha apenas três anos de idade.

Este episódio, me faz lembrar dos filmes de guerra que vemos no cinema e na TV, quando os soldados invadem casas, tomando conta de tudo, tirando a privacidade das famílias.

E foi assim mesmo que aconteceu. As tropas de Getúlio Vargas chegaram, se estabeleceram na fazenda, foram invadindo a casa, e grosseiramente exigindo abrigo e comida. 

Eles se alojaram na fazenda e um dia, o general que comandava a tropa, conversando com o meu bisavô José Pires, presenciou uma cena que mudou toda a história. Em determinado momento, o meu bisavô chamou pelo meu tio, que tinha apenas dois anos de idade, e lhe disse ”Getúlio, vai com sua mãe”.

Surpreso com o que ouviu, o comandante logo questionou o meu bisavô, que para sua surpresa era um apoiador do então presidente, um “getulista”. 

Foi o que bastou para que tudo se transformasse. Eles se tornaram simpáticos, amigáveis e até abasteceram a casa com alimentos, que estavam em falta, justamente por causa da revolução.

Naquele tempo, não tinha internet, mas tinha fofoqueiros e tinham denunciado meu bisavô, como se ele fosse contra o governo. As tropas foram até a fazenda achando que iriam prender traidores.

Minha mãe, a princípio, ficou traumatizada e até sua adolescência tinha medo de policiais, de fardas, mas hoje em dia ela tem muito orgulho desses momentos da sua vida. 

Por Regina Helena

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